terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Capoeira e Identidade

CAPOEIRA E IDENTIDADE
Muniz Sodré
Na atmosfera emocional das nossas salas de aula ou nas entrelinhas dos nossos manuais escolares, ainda ressoam os ecos dos séculos de crença do Ocidente na mortificação da carne e na celebração da “alma eterna”, oposta à concretude temporal do corpo. A fórmula mens sana in corpore sano (mente sã em corpo são), divisa idealizada do esporte ao Anglo-saxão, apenas sacramenta uma dualidade (espírito/carne/mente/corpo) em que um dos termos polares exerce poder controlador sobre o outro: o espírito controla a saúde do corpo.  
  É difícil conciliar essa ética desencarnada com a realidade das formações sociais ou comunidades históricas que fazem do corpo um órgão de expressão, dinamizado pelas formas da ritualização do movimento. Para tais grupos, inexiste a dicotomia mente/corpo, as realidades físicas não se afastam das espirituais.   Na verdade, existe mesmo a possibilidade de falarmos de um “corpo espiritual”, ou seja, de um corpo que não se defina pela mera anatomia, mas pela capacidade de refletir a sua experiência particular no mundo. Ao nos indignarmos sobre as possibilidades conceituais e pedagógicas do “esporte com identidade cultural”, vislumbramos a existência desse” corpo espiritual” no Jogo da capoeira, largamente praticado no Brasil.    Figura do patrimônio afro-brasileiro, a capoeira é mesmo tempo de canto, música, dança e luta.
Diferentemente do esporte europeu – onde a mente separada incita o corpo à sua máxima produtividade mecânica – a capoeira define-se como um Jogo. Este termo não designa aqui simples distração, mas um conjunto ritualístico de procedimentos, voltado tanto para o combate contra o adversário como para a expressão do júbilo corporal, dentro do quadro histórico e mítico da etnia dita negro – brasileira, cujos valores são também ditos “de tradição”. Grupo e Tradição     Para o “homem da tradição”, ser não significa simplesmente viver mas pertencer a uma totalidade, que é o grupo. Cada ser singular perfaz o seu processo de individualização em função dessa pluralidade instituída (o grupo), onde se assentam as bases de sustentação da vida psíquica individual.   
Na realidade, mesmo modernamente, a constituição psíquica do individuo depende da força de continuidade do grupo, de modo que cada um configura-se com um “lugar”, um “território”, ao mesmo tempo singular e social, sempre investindo do desejo ancestral (familiar, clânico) de continuidade da espécie. A Ética (a cultura, em sua originalidade) é precisamente a linguagem desse desejo.    Pelo pertencimento o grupo faz-se imanente ao individuo, enquanto este reencontra-se no grupo. O individuo pertence ao grupo tanto quanto a si próprio, pois ser individuo ou ser grupo equivale de fato a uma função no trabalho de estabelecimento de limites ou de determinação de identidade em face da vasta diferenciação do fenômeno humano. Para o homem da tradição, da Arkhé, está mais do que claro que o subjetivo é também trans-subjetivo.   
 Há, porém, uma diferença entre grupos de pertencimento “primários” ou “naturais” e grupos de pertencimento “secundários” ou “instituídos”. A família-mas também a clã, a etnia – é essencialmente grupo primário. Este grupo, de onde procede a individualização primeira, fornece a matriz da identidade cultural dos indivíduos.    Os grupos de pertencimento secundários são formações instituídas, onde se reúnem indivíduos já constituídos. É necessário, portanto, que a individualização continua na forma da socialização e da interiorização de normas e valores. O processo civilizatório ou cultural opera no quadro dessa secundariedade.    O processo civilizatório do negro no Brasil conheceu uma dialética própria na questão do entrecruzamento das diversas “nações” (etnias) que aqui chegaram como grupos primários.
E havia entre negros as diferenças étnicas, a diversidade das “nações” na diáspora.    As diferenças entreviam-se especialmente na esfera do trabalho “ de ganho” (ferraria, sapataria, carpintaria), em que os negros, forros ou não, se organizavam etnicamente por meio de pontos de trabalho, conhecidos na cidade de Salvador (Bahia) como “cantos” e espalhados por todo território urbano.    A aparente competição comercial dos “cantos”, a diversidade étnica, poderiam suscitar uma forte diferenciação político – cultural. entretanto, a realidade histórica veiculada principalmente por fontes orais dá conta de que na formação sócio – cultural negra (baiana) inexistiu a tão acentuada divisão que ensaístas e historiadores estabeleceram entre as diversas etnias – bantos, gegês, nagôs etc.   
 É certo que a historiografia evidencia rivalidades de diversas ordens (de africanos entre si, de negros e pardos, de crioulos e africanos). É também certo que até persistem diferentes tradições étnico-culturais, como da linha congo-angola, que tem seu paradigma litúrgico no terreiro do Bate-Folha, na Bahia. Mas sabe-se em contrapartida da solidariedade nascida entre os cativos durante a travessia do Atlântico, assim como os “antigos” dos cultos afro-brasileiros falam de um intercâmbio profundo entre as comunidades, capaz de passar por cima de velhas divisões étnicas. Por exemplo negros de várias etnias (nagôs, haussás e outras) tomaram parte na famosa revolta dos malês em 1835.   
Fatos dessa natureza são importantes para a compreensão do ethos cultural afro-brasileiro, porque demonstram que os orixás, os voduns ou os inquices não são entidades apenas religiosas, mas principalmente suportes simbólicos – isto é, condutores de regras de trocas sociais, assim como de “textos” éticos – para a continuidade de um grupo determinado. Zelar por um símbolo, ou seja cultuá-lo nos termos da tradição, implica aderir a um sistema de pensamento, uma “filosofia”, capaz de responder as questões essenciais sobre o sentido da existência do grupo.    No Brasil, esse “grupo zelador de orixá” não é já-dado ou natural, mas constituído, instituído, secundário, embora a família possa ter eventualmente uma certa prevalência hierárquica . São numerosos e todo mundo os casos de grupos étnicos que diante da ameaça de desintegração, combinam-se institucionalmente com outros, gerando formações sincréticas.    
 Tais combinações seguiam uma direção intercultural (nagôs com outras “nações” africanas) e transcultural (negros com brancos). Através de atos interagidos, propiciados pela plasticidade institucional, o indivíduo negro entra em relação com elementos da realidade histórica, mas também pode exercer uma ação sobre elementos da realidade e sobre a estrutura real dos grupos sociais.    A dialética dessa movimentação passa por um interrecionamento complexo entre processos de grupo primário e secundário. No caso nagô, os primários deslocaram-se para o secundário na forma de ritmos, cerimônias, estruturas, que passaram a regular a organização do espaço e do tempo.    Podemos dizer,assim, que no Brasil a etnia teve mais características de grupo secundário do que de grupo de pertencimento primário.
Aqui , o grupo matricial de pertencimento foi o “grupo de terreiro” ou grupo de culto que foi um grupo construído, instituído em função de uma reterritorialização político - cultural do negro em diáspora escrava e de uma dinâmica de comunicação entre os diversos sistemas cultos. Tal é o sentido transcultural e intercultural da movimentação negra no território brasileiro. Tal é a abertura histórica  que institui o “grupo de terreiro” no Brasil como “nação popular”.    Na troca entre as diferenças, pode-se enxergar uma lição prático-teórica sobre a dinâmica real de movimentação das populações econômica  e politicamente subalternas. A posição litúrgico – existencial do elemento negro (espécie de símbolo ontológico das classes subalternas) sempre foi a de trocar com as diferenças, assegurando a identidade étnico-cultural e expandindo-se.
Nessa operação, não vige o princípio da contradição e do terceiro excluído: os contrários atraem-se, banto também é nagô, caboclo pode ser zelado como orixá ou vodum.    Tal posição não é uma acidentalidade história. Acha-se inscrita no ser da diferença nagô, como se pode depreender de muitos textos a exemplo do itan   Atorun d’orun Exu (Cf. Santos, Juana Elbein. Os nagôs e a Morte, vozes), na passagem em que Exu Yangi, o primeiro nascido (que ameaça a existência por sua vocaridade), diante da reação de Orumilá faz o pacto em que delega à humanidade a possibilidade de restituição do que havia comido: “Orunmilá deveria chamá-lo/ se quisesse recuperar a todos e / cada um dos animais, das aves / que ele tinha comido sobre a terra / ele / Exu os assistiria para / reavê-los das mãos da humanidade”. 
   O que se vai restituir é o Axé, a força de realização que torna possível e dinamiza a existência. E a restituição requer a complementação um dos fundamentos do complexo teogônico nagô – entre o que poderíamos chamar de “parceiros” da existência: mortos (ancestrais) e vivos, egum e orixá, orixá masculino e orixá feminino, lado esquerdo, gegê e nagô, congolês e angolense, gegê, congo – angolense, enfim a complementação histórica das nações em suas vicissitudes existenciais.    Das matrizes dessa irmandade sub-nacional, pode-se extrair a lição de um “humanismo prático”, que se consubstancia na abertura para as diferenças no interior de um mesmo território político. A dialética particular das instituições afro-brasileiras reencontra-se na prática com o que, na teoria, um certo pensamento ocidental da diferença chamaria de “projeto aberto”.
Ou seja, os homens advêm à sua essencialidade na medida em que situam no mundo com projeto aberto e instituído pela existência entendida como algo que transcende a presença pura e simples dos entes ou das coisa do mundo. Essa existência implica responsabilidade (obrigação) e parceria (ser junto a outro). Corpo culturalizado Isso tudo transparece no jogo de capoeira, De que maneira? Pode-se responder inicialmente, citando um comentário de T. Deshimaru sobre as artes marciais japonesas: “O comportamento no jogo reflui sobre nossa vida cotidiana. Cada gesto é importante. Como comer, como arrumar, como vestir-se, ir ao banheiro, como portar-se em frente aos outros, com a família, com a mulher, como trabalhar, com ser completamente em cada gesto”.  
  “Artes marciais” aí não se entendem como meras técnicas de guerra corporal, mas como um estilo de existência, ligado à história do grupo que as práticas. são de fato um prolongamento de todo um modo de pensar ( o Zen-Budismo), onde é vital a presença de si em cada gesto executado, onde a extraordinária técnica corporal vincula-se a uma forma particular de consciência que privilegia a intuição. A harmonia entre o corpo e o espírito comanda continuamente a ação do sujeito.    Essas “artes marciais”, assim como a capoeira , são jogos com identidade cultural, ou seja, são atividades corporais que remetem a uma história e seus desdobramentos na atividade concreta dos sujeitos. O corpo que “joga” não pode ser reduzido a uma representação anatomo-fisiológica , porque é atravessado em sua existência cotidiana pelos fluxos de um corpo imaginário oriundo do drama de sua identidade cultural.
As modalidades de ação, a diversidade dos gestos, são afetadas por um tipo de sociabilidade, cuja compreensão é indispensável a estratégias pedagógicas mais amplas.    A capoeira é uma forma de resgate de experiências expressivas não verbais, em conexão com as experiências fundamentais de coordenação motora. É ademais expressão, no sentido da transmissão deliberada de valores da vicissitude constitutiva da identidade afro-brasileira.    A possibilidade que ela dá ao sujeito de fundir-se como um todo (uma história, uma territorialidade, um mito) faz dela uma “arte” (sentido ampliado de “jogo”)- uma arte brasileira do corpo. É, portanto, formativa, enquanto a veiculação de uma tradição ética centrada no corpo integrado e afinado com as especialidades do território nacional. A virtualidade pedagógica e estética de jogo da capoeira é imensa. 

domingo, 11 de setembro de 2011

Curiosidades da capoeiragem


Mestre Bimba só aceitava na sua academia alunos que tivessem a carteira de trabalho assinada, fossem estudantes ou tivessem alguma ocupação reconhecida.
Antigamente havia um "Berimbau de boca"ou "trompa de Paris" no qual a caixa de ressonância, em vez da cabaça, era a boca.

"Esquenta Banho" era a senha que mestre Bimba dava a seus alunos para um jogo rápido, apressado. A expressão nasceu após as aulas, quando Bimba obrigava os alunos a tomar banho frio, ligeiro, porque a caixa d'água era pequena.

Os capoeiristas costumavam usar calças boca de sino e no período em que a capoeira ficou proibida por lei(1890-1937) a polícia, para detectar os capoeiristas, colocava um limão dentro das calças do indivíduo. Se o limão passasse pela pernas e saísse pela boca das calças, a pessoa era considerada capoeirista.

Mestre Bimba entregava a seus discípulos um lenço azul após a conclusão do curso, um lenço vermelho após a primeira especialização e um lenço amarelo após a segunda especialização.

"Vadiar" significa jogar por prazer, por diversão. Na época da escravidão a vadiação era o lazer dos escravos nas horas de descanso.

Os capoeristas eram contratados pelos políticos para bagunçar no dia das eleições. Enquanto as pessoas desviavam a atenção para a confusão dos capoeiras um indivíduo colocava um maço de chapas na urna ou na linguagem da época "emprenhava a urna". Vencia as eleições o candidato que dispunha de maior nº de capoeiras.

Canjiquinha foi o criador da Festa de Arromba, jogada nas festas do Largo da Bahia. Nessas comemorações vários capoeiristas se reuniam e jogavam em troca de dinheiro e bebida.

"Crocodilagem" é o nome dado a um jogo duro que submete o capoeira a uma situação de inferioridade ou deslealdade.

Em 1824, os escravos que fossem pegos praticando capoeira recebiam trezentas chibatadas e era enviadas para a Ilha das Cobras para realizar trabalhos forçados durante três meses.

Milhares de capoeiristas foram para a Guerra do Paraguai, pois havia sido prometida a liberdade no final do conflito àqueles que participassem da batalha.

"Caxinguelê" é o nome dado a meninos que praticam capoeira.

Antigamente, era de costume os capoeristas trajarem terno de linho branco. Era considerado um bom jogador aquele que conseguisse sair da roda com o terno impecavelmente limpo.

A orquestra do samba de roda

é composta por pandeiro, violão, chocalho

e prato de cozinha arranhado por uma faca.

A luta de Bimba que demorou mais tempo durou um minuto e dois segundos.

O Toque de Angola: assim como o toque de São Bento Pequeno são freqüentemente usados para acompanhar o canto da ladainha e o canto de entrada, podendo também serem usados para acompanhar o canto corrido, quando os dois capoeristas vão jogar lentamente.

O Toque de São Bento Grande: é muito importante, pois acompanha qualquer tipo de jogo, além de ser ideal para o acompanhamento dos toques corrido.

O Toque de São Bento Pequeno: é um toque intermediário entre o toque de Angola e o Toque de São Bento Grande.

O Toque de Íuna: É um toque fúnebre para grande solenidade e tristeza. Não há canto. Também é um jogo de marcação, feito por mestres e professores, visando a objetividade e a utilização de golpes traumatizantes.

O Toque de Benguela: era usado para acompanhar o "jogo de faca" hoje extinto era um determinado jogo de capoeira onde um ou dois capoeristas empunhavam uma faca , lutavam ou simulavam uma briga entre si.

O Toque de Cavalaria: é um toque de aviso e não para ser usado em jogo de capoeira. Toque que imita o trotar do cavalo, avisando que há polícia nas proximidades. Esse toque foi criado por volta de 1920 para avisar a chegada da cavalaria de "Pedrito", um temido delegado de polícia que perseguia os capoeiristas. Antigamente, quando os capoeristas eram perseguidos, criou-se o Esquadrão de Cavalaria de Guarda Nacional que teve, numa determinada época, como incumbência maior, combatê-los. Daí originou o Toque de Cavalaria. Um capoerista ficava com um berimbau em uma colina ou numa esquina, um pouco distante de onde formava-se a roda de capoeira e, quando a Cavalaria da Guarda Nacional aproximava-se , o capoerista que estava vigiando dava início ao Toque do mesmo nome, avisando aos camaradas que fugiam ou então se preparavam para enfrenta-los em violentas batalhas.

O Toque de Samba de Roda: só é usado para a execução do samba de roda e do samba duro. No samba de roda, enquanto os instrumentos tocam, o povo dança, à maneira dos africanos , aos pares ou em grupo. No samba duro, que só é permitido para homens, enquanto sambam aplicam rasteiras entre si.

O Toque de Apanha a Laranja no Chão Tico-Tico: nas festas de Santa Bárbara, era usado para o "torneio" que consistia no seguinte: dois capoeristas exibiam-se tentando apanhar com a boca um lenço branco que era jogado no meio da roda, consagrando-se vencedor, aquele que o apanhava O referido toque é acompanhado da melodia do mesmo nome, que originou-se deu uma brincadeira de roda, muito conhecida em rodas que tem a presença de mestres antigos que botam uma cédula no meio da roda e começam a jogar em busca dela.

O Toque Jogo de Dentro (Amazonas) são usados de preferencia em cantos corridos e é utilizado o jogo de dentro.

Os Toques de Santa Maria e Idalina: São toques usados para jogo de navalha.

O Toque Gegy: É um toque vigoroso. O jogo da capoeira é em Angola, a diferença está no toque do berimbau, no repique, onde predomina a influência do Gegy-Nagô.

O Toque Samango (Samanto): Criação de mestre Canjiquinha. É lutado de lado, tem a presença de poucos movimentos. Sua característica de manifestação é a chapa giratória, a chapa de lado, rasteira e o vôo do morcego.


quinta-feira, 28 de outubro de 2010

A Tradição na Capoeira Angola, Instrumento de Libertação ou de Dominação?

A Tradição na Capoeira Angola,
Instrumento de Libertação ou de Dominação?
Texto de autoria das Angoleiras
da Áfricanamente Escola de Capoeira Angola


Na Capoeira Angola, assim como em outras expressões culturais afrodescendentes, a produção do conhecimento se dá através da oralidade. O mais velho é responsável pela transmissão ao mais novo, sempre com o compromisso de manter a essência da origem.
A tradição na Capoeira Angola permite que hoje possamos praticar e ter o contato com essa arte ancestral sem que se perca, com o desgaste do tempo ou com as sabotagens do sistema, suas características: a necessidade de sua existência, a intensidade da luta, o desejo por liberdade, a expressão dançarina dos corpos, a africanidade, a mandinga, a negaça, a malandragem, a enganação, o enigma, a ligação com o espiritual e a brincadeira lúdica de vadiação. É a forma não escrita de preservar e transmitir o legado dos velhos capoeiras.
A tradição sempre pertenceu também à mulher, que, protagonista da vida, transmite sua experiência às crianças, revela receitas de cura, é guardiã de histórias, guerreira incansável com força interna e física, participante da grande roda da vida.
Mas como são construídas, na contemporaneidade, as relações de gênero na Capoeira Angola?
São evidentes as diferenças, construídas socialmente, entre homens e mulheres capoeiristas. Falamos de diferenças que são apresentadas como naturais e inquestionáveis, como por exemplo, "a sensibilidade feminina” x “a força masculina".
Não precisamos de uma análise muito profunda para identificar, neste discurso, condições desiguais de exercício de poder na roda de capoeira, onde as mulheres, que historicamente acabaram ocupando posições secundárias, foram subjugadas, rotuladas, subestimadas ou vistas como objeto de decoração servil aos prazeres sexuais.
Colocar essa temática em discussão é um dos objetivos desse evento que convencionamos chamar de "Adão, Adão cadê Salomé, Adão?".
Acreditamos na força de nossa voz e na Capoeira Angola como instrumento educador, capaz de transformar situações de discriminação e injustiça em diversos níveis. Por esse motivo buscamos novas formas de relações entre mulheres e homens capoeiristas.
Assim como na sociedade em geral, também na Capoeira Angola as mulheres têm atuado e se engajado. Percebe-se hoje a quantidade crescente e expressiva de alunas atuantes nas escolas e grupos de capoeira.
Vale lembrar que o enfraquecimento da mulher vem de outras culturas européias de santificar, esconder e fragilizar, e não das culturas de matriz africana, que nos ensinam a força das mulheres guerreiras, das mães, do respeito e da coletividade que sem as mulheres não seria possível.
No sistema social em que vivemos nos querem apáticas. A Capoeira Angola quebra com essa lógica. Gingamos na roda, nas voltas que o mundo dá, nos movimentamos contra a gravidade e cantamos alto para que nos escutem os ancestrais. Só os peixes mortos seguem a correnteza do rio.
Não nascemos com sentimentos de preconceito, isso não vem da nossa natureza.
Para nós, da Áfricanamente, não nos servem mais os argumentos equivocados e preconceituosos que se escondem no discurso da tradição com o intuito de perpetuar relações de dominação que acabam por enfraquecer o axé das camaradas.
Manter cânticos ou formas de organização na roda que venham carregados desses valores dominadores não contribui em nada para a libertação e o respeito que todas e todos buscamos através da Capoeira Angola.
Costumes se modificam através dos tempos e como a capoeira não é estática, ela negaceia por ânsia de sobrevivência. Os que virão depois de nós saberão da movida de homens e mulheres na busca da quebra das correntes de nossos corpos e mentes e de nossas relações.
Nem mais submissão, nem mais dominadores. Nem mucamas, nem senhores.
Em março de 2008 realizamos uma semana de evento com oficinas, bate-papo e vivências que propôs um momento de olhar as relações de gênero na capoeira angola no sentido de fortalecimento das angoleiras. Foi o “II Adão, Adão Cadê Salomé, Adão?”.
A escolha do tema "Tradição na Capoeira Angola: instrumento de libertação ou de dominação?" veio para fomentar o aprofundamento desta reflexão, que contribui para o crescimento coletivo da capoeira de homens e mulheres.
Mestra Elma, grande amiga e referência da família Áfricanamente, trouxe o ensinamento do Mestre Patinho que marcou a todas e todos nós: “É necessário inserir o novo no velho sem molestar a raiz”.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Capoeira Angola e educação ambiental - africanamente escola de capoeira angola




Capoeira Angola e Educação Ambiental
Mag e Guto
Compreendemos que a Educação Ambiental trata-se de uma de sensibilização para a relação com o meio ambiente, pois sabemos da sua existência e que de uma forma ou outra nos relacionamos com ele. A questão é a qualidade dessa relação. Devemos buscar aprender, reconhecer, valorizar e a agir de forma que faça bem a nós e ao ambiente.
Essa sensibilização pode ser de várias formas, vários meios de acessar e despertar nos indivíduos a consciência que fazemos parte deste todo, isso pode ser com saídas de campo para o mato, abraçar uma árvore, observar os pássaros ou trocar idéias sobre o assunto. Uma roda de capoeira ao ar livre, com as pessoas cantando, tocando o chão, se sentindo bem é uma forma de sensibilização, mas tem questões que podemos nos aprofundar aí.
Nós da Áfricanamente Escola de Capoeira Angola acreditamos no potencial educacional da capoeira angola, através dos valores afrodescendentes que esta arte preserva.
A vivência de uma roda de capoeira é uma forma lúdica de nos conectar, de reverenciar a terra, sua musicalidade é feita com instrumentos que trazem a sabedoria do mestre em cortar a madeira certa, reconhecer as sementes, aproveitar o couro e reciclar arame de pneu ao invés de comprá-lo. Na corporeidade da capoeira está a inspiração nos animais haja visto o nome dos movimentos, rabo de arraia, escorpião, vôo do morcego, caranguejo, passo do gato, assim como sua estética. E a questão da saúde, que a prática da capoeira traz, acompanhada na atualidade com a questão da alimentação menos agressiva e do uso da bicicleta como meio de transporte de muitas pessoas que a pratica.
As cantigas da roda trazem na sua oralidade mensagens de uma vida próxima a natureza “a maré subiu, sobe maré, a maré desceu; desce maré”, “apanha a laranja no chão tico-tico”, “pomba vôo, pomba vôo”, “Biriba é pau pra fazer berimbau”.
Valores éticos da cosmovisão de mundo africana, preservados na Capoeira Angola, como “O Ser integrado ao todo”, nos trazem referenciais do papel do indivíduo não só na sociedade, mas compondo também o ambiente. A complementaridade nos apresenta a idéia que quando nos juntamos nos completamos num coletivo com mais opções, vivências, saberes e práticas e esta troca valoriza e heterogeneidade e diversidade de um grupo.
Comunitarismo tem uma proposta de organização que valoriza a harmonia de uma comunidade como um organismo vivo capaz de solucionar coletivamente suas questões e compartilhar recursos, caminha no sentido contrário da sociedade individualismo atual que gera um consumismo e desperdício de recursos.
Axé é poder de realização ou energia vital que circula em nós e em tudo que tem vida é alimentado e estimulado com outros elementos como a água, as folhas tradicionais, pedras, alimentos... Esse valor se apresenta no mítico de toda expressão cultural e visão de mundo que vem de África e que se desenvolveu na diáspora.
Se formos prestar atenção no momento histórico de 1980 em nosso país veremos o levante de muitos movimentos sociais e circulação de informações em locais como a universidade, aí perceberemos outra tangente entre a Capoeira Angola como Movimento Negro e os movimentos ambientalistas que tomaram outras proporções após a reabertura democrática. Isso cria nos capoeiristas inclusive nos mestres uma consciência e iniciativas práticas de cunho ambientalista.

Porto Alegre, Outubro de 2010

sábado, 8 de agosto de 2009

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Este é o evento que você estava esperando!


Circuito de Oficinas, Palestras e Visitações a Capoeira Angola de salvador

É a sua oportunidade de conhecer a Capoeira Angola de Salvador, ir as rodas dos grandes Mestres Guardiões da Cultura, passear pelos locais históricos da capoeiragem e ainda apreciar as belezas naturais da cidade, ao lado de um grupo de pessoas de alto astral e de várias partes do Brasil e do Mundo.
Mas corra! As Vagas estão acabando!
Maiores informações, acesse:
www. eventosafricanamente.blogspot.com

segunda-feira, 20 de abril de 2009